top of page

LETRA DOS POEMAS E MÚSICAS DO CD “VELHO AMIGO (2014)

Músicos de: Paulo Roberto Padilha (letras, músicas, voz e violão, produção do CD).

Músicos: Felipe Mancini (captaçoes, mixagem, masterização, arranjos e direção musical), Zi Arrais (voz, piano), Júlio Dreds (percussão), Valentina Pecora (Flauta transversal, vocais), Ivan Silva (percussão, bateria), João Arruda e Franco Galvão (captações inicias das músicas).

 

1. Suíte

“Dez poemas escritos a mão:1três sobre o mar e sete sobre o sertão”

Poemas de: Carlos Rodrigues Bramdão

Músicas de: Paulo Roberto Padilha

 

 

Os três do mar

 

tudo o que vem se move

 

Agora cada vez me vem o mar.

Guardador de outonos, eu me assusto

De olhar para trás e me ver vindo. [2 x ]

Era ontem um tempo não sabido

e então, do que eu me lembro quando é noite

e do alto do céu Órion me fala: [ 2 x ]

é noite ainda, é noite, olha? [ 4 x ]

Venho de um tempo quando eu era vento

e voava em maio de um país a outro.

E hoje quando há vento, aqui, do alto deste monte

vejo que a noite, o tempo, o mar e o vento

tudo o que vem se move, menos eu, agora. [ 6 x ]

 

Ilha de Santa Catarina2 - Florianópolis

 

Uma ilha-barco aporta para sempre

 

Uma ilha como um navio ancora aqui

Derruba velas e pede a paz ao vento

Deixa que a areia banhe a sua proa

Brinca de ser porto quem foi trilha

E acolhe nos mastros as gaivotas. [ 2 x ]

Uma ilha-barco aporta para sempre

e se cobre de ninhos e paineiras

e de mangues e de praias, de capelas

e de festas de santos padroeiros.

Uma ilha é um navio que não navega

e acolhe a cada dia um navegante.

 

Ilha de Santa Catarina - Florianópolis

 

e agora longe, quando eu me vou

 

Amei o mar.

Foi quando era menino

e molhava os pés na água

e era anjo.

Gostava de andar pela areia

ali, onde a onda se termina. [ 2x ]

O mar não era mau nem inimigo

e morrer nele era morar em outra casa.

E agora, longe, quando eu me vou

por caminhos onde há vales e veredas

é o mar que amei quem vai comigo [ 4 x ]

 

 

Os sete do sertão3

 

e de longe, de repente, o que se via

 

Lembro de quando

um boi vinha na estrada.

Era manhã e o sol era

Como um céu de meio dia.

E era em Minas

a estrada estreita e antiga

por onde o boi viajava e vinha.

E de longe, de repente o que se via

do alto deste canto em Minas

era um boi parado numa estrada

e uma estrada que pelo boi caminha

 

Ilha de Santa Catarina - Florianópolis

 

 

e o rio assiste, mudo, estranho

 

Agora, ali onde é longe

já o sertão de Rosa

não é mais como antes fora.

Um boi berra, outro responde

e o vento é como sempre, ele ressoa

entre o que foi vereda e hoje é pasto

e o odor da vida é outro:

um cheiro acre, amaro mel.

Cobre o chão do cerrado um tapete

em tudo igual ao mesmo

e é verde, mas ainda é vivo?

Sem mais o desenho e a cor

que as águas quentes de janeiro

multiplicam no corpo do sertão.

As maritacas voam e gritam

perguntando por mangabas

e o rio assiste, mudo, estranho

o sumir de pacus [ e de piaparas ] 4

E entre chapadas e veredas

a dança das emas some agora

porque somem as emas que dançavam.

 

Montes Claros

 

 

À espera do apito ao longe

 

Velhos, os vaporzeiros

Vestidos de cinza cor da cinza

Vigiam as águas que navegam

Das montanhas altas de Minas

Aos campos lentos dos Gerais

À espera de um apito ao longe

Do vapor que vinha, e não vem mais [ 3 x ]

 

Pirapora – beira do São Francisco

 

 

Sonha o rio um dia ser lagoa?

 

É preciso ouvir o canto do silêncio

desses rios de alma lenta do sertão

quando descem entre planos e planuras

empurrados [ por agosto e o seu cantar. ] 2 x

Sonha o rio um dia ser lagoa?

Sonha deixar de navegar

e abrir entre os ocos do cerrado

seu pequeno oceano em chão mineiro

e a geografia de seu próprio mar [ 4 x ]

 

Pirapora, beiras do São Francisco4

 

 

Dois hai-kais e um poemeto

 

o primeiro

 

clareia

todo o chão da noite

o lugar da lua cheia.

 

Pirapora, beiras do São Francisco

 

 

o segundo

 

agora não há sombras

não ainda.

o que sombreia a noite

quando é vinda?

 

 

o terceiro

 

um passarinho voa

ou é o vento

quem viaja nele?

 

Ilha de Santa Catarina – Florianópolis

 

Em maio, em 2006 (os dez poemas)

Em dezembro de 2007 (as dez musicalizações)

 

 

2. Velho amigo

 

Letra e música: Paulo Roberto Padilha

 

 

Adeus, adeus, velho amigo

Nossas vidas vão seguir

Os caminhos seus, os destinos seus

Os passos seus, os rumos seus

 

Mas não se esqueça de mim por onde você for

Nas suas alegrias, nos momentos de dor

E seja como for, creia sempre no amor

No amor, no amor, no amor, no amor

No amor, no amor, creia, creia no amor (refrão)

No amor, no amor, no amor, no amor

No amor, no amor, creia no amor

 

E qualquer dias desses

Em outras terras, em outros mares

Noutros lugares, a gente vai se encontrar

A gente vai se lambuzar,

A gente vai se resgatar

A gente vai desembestar

A gente vai se descobrir novamente

 

Refrão...

 

 

3. Ela

 

Letra e música de Paulo Roberto Padilha

 

 

Ela não diz “não” por acaso

Ela não diz “sim” sem pensar

Ela já caminhou sem asas

Ela já soube enfrentar

 

O mundo inteiro: dores, pesadelos, ameaças, tempestades

De janeiro a janeiro: sonhos renovados, novos planos traçados

É corre-corre pra lá, é vira-vira pra cá

 

Não tem descanso, nem horário

É ligada no trabalho

Adora se reinventar

 

Ela não pode parar

Ela, a vida, não pode parar

De resistir, de insistir, de acreditar, de apaixonar

Ela não pode parar

Ela não pode parar BIS

A vida não pode parar

De vez em quando até balança

Mas avisa: só descansa

Pra poder começar

 

4. O metrô vai chegar

 

Letra e música: Paulo Roberto Padilha

 

Oba, vai chegar

Oba, vai chegar

O metrô vai chegar

O metrô vai chegar (2 x) - refrão

 

Estamos aqui tão contentes

Excitados, molhados, sorridentes

Aguardando ansiosos a inauguração

Prometida para a última eleição

 

Aqui se batalhe pra xuxu

Aqui se vive tomando

Condução lotada

Condução quebrada

Condução gaseificada

Que condução?!

 

Esse dia, enfim,

Chegará, e o nosso sonho

Vai então se realizar

Viajar de metro

Total integração

Norte-sul-leste-oeste

Que feliz união

 

Conhecer um amor

No reflexo da janela

Ler jornal, passear no vagão

Chegar fresco ao trabalho

Dar bom dia ao patrão

Receber o salário

Em vales-transporte na mão

Nossa mãe!!!

 

E depois de dez horas

De total euforia

Retornar saltitante

De alegria

 

Esquecidos do tempo

Da “Central do Brasil”

Ainda bem que estamos

No ano três mil

No ano três mil

No ano três mil

 

E o metrô vai chegar

E o metrô vai chegar

E o metrô vai chegar... lá pro ano três mil

E o metrô vai chegar...

 

 

5. A cidade

 

Letra e musica: Paulo Roberto Padilha

 

A cidade não dorme

A cidade transpira

A cidade acolhe

A cidade inspira

A cidade é conflito

A cidade é dura

A cidade é beleza

A cidade é feiura

 

Como é que a gente sossega

Como é que a gente atura

Ver gente abandonada

Vivendo em plena rua

Por que a cidade se cala

E nega a natureza?

Por que a cidade maltrata?

Quem inventou a pobreza?

Quem inventou a riqueza?

 

Quem pode responder e ajudar

A cidade a ser bem melhor

Pra viver (Refrão)

Transformar, aprender

Pra cidade cantar

E pulsar com você?

 

A cidade é palco

A cidade é cenário

A cidade é desejo

A cidade é trabalho

A cidade é arte

A cidade é cultura

A cidade é esporte

A cidade é ternura

 

Nossa cidade tá prenha

Nossa cidade tá nua

Nossa cidade educa

Ela é todinha sua

Nossa cidade merece

Um pouco mais de poesia

De norte a sul, leste-oeste

Centro e periferia

Nossa cidade arrepia!!!..

 

Refrão...

 

 

 

6. Estopim

 

Letra e música: paulo roberto padilha

 

Olha, amigo, te digo, tentei esperar

Cheguei ao fundo do poço de tanto penar

Tive na vida desgostos de endoiceder

Comi o pão que o diabo amassou

Sem nunca merecer

 

Vivo escandalizado

O medo aprendi a enfrentar

Todo esse quebra-cabeça

Confesso: não sei decifrar

Mas.... Cansei!

 

Quando a rua gritar

Quando a noite florir

Antes da cara pintar

Da marcha começar

Da nação resistir

Já estarei aqui

Por um triz , aí... aí...

 

Quand on péte le plomb

Quand le désir insister

Avant le lever du soleil

Lorsque la mèche brûle

La ville donne naissance

Je serai déjà ici

Par un cheveu

Là-bas là-bas

 

Quando o caldo engrossar

Quando o desejo insistir

Antes do dia acabar

Do estopim deflagrar

Da cidade parir

Já estarei aqui

Por um triz, aí... aí...

 

 

 

 

7. Negra e mulher

 

Letra e música: Paulo Roberto Padilha

 

Uê-eiê, uê-eiê, uê-eiê, uê-ê-ê

Etacá-cundê, etacá-cundê (bis)

 

E sou negra e sou mulher

Tenho o meu jeito de ser

Minha cor sempre marcou

Essa força de viver

Já andei de norte a sul

Morte e vida pude ver

Nos meus traços corporais

Nos meus laços ancestrais

 

E aprendi

Que sou procura

Sou firmeza, simpatia

Inteireza, resistência e liberdade

Sou alforria, luta e paz

Sou boniteza, dentro e fora

Sou ternura, sou espiritualidade

Dança, ritmo e magia

 

Mas com certeza

Para além de ser eu mesma

Sou também a natureza

Que em mim vive e habita

Sou negritudes

Sou indígenas-brancuras

Disciplina, travessuras

Sou quem vês, sou quem transita

Nas avenidas que refletem a história

Ultrapassagem e memória

De tanta barbaridade

 

Sou terra e fogo

Água e ar

Sou poesia

Mas também sou quem recria

Uma outra realidade

 

De espaço e tempo

De chuva e vento

Eu sou o céu, o lago, a maré

Sou a tradição e até

 

Transcendência e razão

Tato, olfato e visão

Paladar e audição

Quietude e som

Capoeira e audição

Movimento e emoção

Substância e explosão

 

Sou esperança e sou paixão

Sou esperança e sou paixão

Sou esperança e sou paixão

 

Uê-eiê, uê-eiê, uê-eiê, uê-ê-ê

Etacá-cundê, etacá-cundê ... (bis)

 

 

 

8. Tendências

Letra e música: Paulo Roberto Padilha

 

Menino só sem ter ninguém

O pai se foi, a mãe também

Vai batalhar prá ser alguém

Vendendo balas dentro do trem

Dentro do trem

 

Foge rapaz, sem documento

Que vem atrás mais sofrimento

Já apanhou sem julgamento

E quis vingar o seu tormento

 

Homem cruel se transformou

De tanta dor que ele provou

Sabe matar se lhe convém

Mandando balas dentro do trem

Dentro do trem

 

Foge audaz, sem documento

Que vem atrás policiamento

Foge audaz, sem documento

Que vem atrás policiamento

 

Que vem atrás mais sofrimento

Que vem atrás policiamento

Que vem atrás mais sofrimento

Que vem atrás policiamento

 

Que vem atrás policiamento ...

 

 

9. Bossa Nossa

 

Letra e música: Paulo Roberto Padilha

 

Lá vem a “massa”

Chegou a bossa

Pra sacudir a praia

Pra aliviar a nossa barra

Pra acabar com a fossa

Tá rejuvenecida

Toda de bem com a vida

Amanheceu

Bossa nossa apareceu

 

Ai que vontade me dá

De cantar à beça, à nossa!

A qualquer hora ou lugar

Resistir não há quem possa

 

Fox, rock, frevo, maxixe, baião

Lambada, erudita, chorinho e sambão

Tudo isso é bossa

É muito mais se a gente gosta

Tudo isso é bossa nossa

É todo o som que a turma gosta

Isso é bossa nossa

É a nossa bossa

 

 

10. Estrelato

 

Letra e música: Paulo Roberto Padilha

 

 

Toc-Toc-Toc-Toc-Toc-Toc...

 

- Pois não?!!! Pois não?!!!

 

- Olá!

Quero saber se há um lugar para mim nesse espetáculo

Eu canto, eu danço, faço mil estrepolias

Palhaçadas, provoco gargalhadas.... hahahahahahahaha...

Sou ótimo ator, coreógrafo, cenógrafo, encenador

Sou também encenador!

 

Porém se estiver tudo ocupado

Não me faço de arrogado

Aceito dividir meio a meio, o palco

Com o astro principal, com a primeira bailarina

Ficando em semi-evidência até o fechar das cortinas

Ficando em semi-evidência até o fechar das cortinas...

 

Tudo ok se não há jeito

Ainda bem que eu sou perfeito!

Compondo trilha sonora

Escolhendo o figurino

Afinando a iluminação

Acertando a sonoplastia

E tirando fotografias... e tirando fotografias!!!

 

Mas, se mesmo assim, não houver vaga para mim

Concordo em ser figurante, contra-regra, maquinista

Cuidar da carpintaria

Carregar o cenário, afinar piano

Segurar o canhão até o fim do ano

Só até o fim do ano...

 

Tudo ok se não há jeito

Ainda bem que eu sou perfeito!

Pra vender os programas

Ficar na bilheteria

Receber os bilhetinhos

Vigiar a portaria

E limpar todo o teatro logo após o espetáculo

E limpar todo o teatro logo após o espetáculo....

 

 

 

 

 

 

 

 

1 De fato todos eles foram originalmente escritos a mão, em folhas pautadas de um bloco de cartas marca BRASIL. Três deles, todos eles sertanejos, escritos em Montes Claros e em Pirapora, na beira do rio São Francisco. Os outros sete, de mar e de sertão, escritos em Florianópolis, na beira do mar, durante o outono de maio de 2006. A musicalização dos poemas foi feita no bairro de Itaquera, zona leste da cidade de São Paulo, de 28 a 30 de dezembro de 2007.

2 Durante muitos anos chamada: Desterro, Ilha do Desterro

3 No ano em que festejamos os cinqüejnta anos de publicação do Grande Sertão: veredas e do Corpo de Baile, de João Guimarães Rosa.

4 Que vira lagoa mansa em Três Marias e lagoa furiosa em Sobradinho.

IMG-7871_edited.jpg
20140405_Padilha_Show_PUC_125.jpg
bottom of page